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Comer um limão inteiro acaba com as enxaquecas?

24 Nov 2023 - 09:11
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Comer um limão inteiro acaba com as enxaquecas?

“Descobri que, se comer um limão cru, acabo com as enxaquecas”. É esta a descrição de um vídeo publicado no TikTok. Mas será assim tão simples e acessível o tratamento deste problema?

É verdade que comer um limão acaba com as enxaquecas?

Em declarações ao Viral, Sandra Moreira, neurologista no Hospital Pedro Hispano, assegura que, do ponto de vista puramente científico, “não há evidência nenhuma” de que este método funcione em larga escala ou até em grupos particulares. “Não há estudos feitos com o efeito do limão”, acrescenta. 

“Às vezes, surgem algumas modas nos tratamentos da enxaqueca, porque basta uma, duas, ou três pessoas partilharem que melhoraram com um certo alimento ou tratamento, para aquilo parecer que tem um efeito que na verdade não tem. Ou seja, aquilo a que chamamos efeito anedótico”, começa por explicar.

A especialista adianta que isto não significa que não possam existir pessoas que tenham “melhorado a enxaqueca ao ingerir um limão”. No entanto, completa, “era preciso saber se tomaram outro tipo de medicamentos juntamente com o limão para perceber se foi o limão ou não que teve esse efeito”, assinala.

Também Isabel Luzeiro, presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia e responsável pela Consulta de Cefaleias no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), afirma que não existe evidência científica de que, ao comer um limão, as enxaquecas parem. 

Citrinos têm alguma influência nas enxaquecas?

A neurologista Sandra Moreira diz que não existe evidência científica relativamente a alimentos que possam parar com as crises de enxaqueca.

“A única substância ingerível, fora medicação, que se sabe que em algumas pessoas ajuda de forma significativa a controlar a enxaqueca é o café, ou bebidas contendo cafeína porque a cafeína potencia o efeito de analgésico”, aponta.

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Tirando isso, continua, “não há nenhum alimento, incluindo citrinos, que esteja estudado no tratamento abortivo das crises de enxaqueca”, conclui.

O que são enxaquecas?

Em declarações ao Viral, Isabel Luzeiro explica  o que são as enxaquecas.

“Genericamente, é uma dor de cabeça. No entanto, as enxaquecas têm a particularidade de ser uma dor crónica, que pode ser mais ou menos incapacitante e que acontece por episódios”, indica. 

Trata-se de uma doença crónica porque não tem cura, é permanente e surge em vários momentos ao longo da vida.

Para entender melhor do que se trata uma enxaqueca, Isabel Luzeiro dá o seguinte exemplo: “É uma dor pulsátil, como se tivéssemos um martelo na cabeça a dar marteladas”.

As enxaquecas podem provocar vómitos, sensibilidade à luz e ao barulho e podem agravar se quem sofre desta maleita fizer tarefas simples como afastar um móvel em casa, ou mesmo outro tipo de atividades de rotina. 

Atinge mais mulheres do que homens

As causas das enxaquecas são ainda desconhecidas. Contudo, a especialista em neurologia diz que se pensa que pode haver um fator genético “transmitido pelo sexo feminino”, uma vez que quem sofre de enxaquecas costuma ter outros casos na família.

É uma doença do adulto jovem, que atinge mais a mulher do que o homem. Na mulher, começa a aparecer a partir do momento em que surge a menstruação. Anos mais tarde, com a menopausa, cerca de “dois terços das mulheres deixam de ter enxaquecas”.

Apesar de ser uma doença que afeta mais os adultos, também existem “crianças que têm enxaquecas”.

O que pode provocar enxaquecas

Cada caso é um caso e, como tal, o que provoca uma enxaqueca ou mesmo uma crise ao indivíduo 1 não é necessariamente o mesmo que vai causar ao indivíduo 2.

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“Por exemplo: não dormir, ou dormir pouco, fazer aquilo a que nós chamamos de privação de sono. Ou, pelo contrário, acordar sempre às 07h00 e ao fim de semana dormir até às 10h00. Ou seja, alterar o ciclo circadiano faz com que tenhamos uma ‘enxaqueca de fim de semana’, que nós não sabemos se é devido ao facto de dormir mais, muito mais, ou se é devido ao facto de quem toma café, por exemplo, não tomar o café à hora habitual”, explica Isabel Luzia. 

Depois, existem outros fatores como o stress ou a alimentação. “O chocolate é um grande desencadeador de enxaqueca em pessoas suscetíveis. Mas cada caso é um caso”.

De acordo com a neurologista, o álcool também pode ter aqui algum efeito, sendo o vinho branco e os vinhos que têm muitos taninos “os que desencadeiam mais enxaquecas”. 

Como é feito o diagnóstico

A presidente da Sociedade Portuguesa de Neurologia explica que ainda não existe qualquer marcador biológico que possa identificar e dizer que “esta pessoa tem enxaqueca porque tem este marcador positivo”. 

Como isso ainda não existe, o diagnóstico é feito com base na conversa entre o paciente e o médico especialista em neurologia.  

Mas Isabel Luzeiro diz que, hoje em dia, sabe-se que há “substâncias importantes na génese da enxaqueca”. Uma dessas substâncias é designada por CGRP

“Esta substância é muito divulgada porque os novos fármacos específicos para as enxaquecas, tanto para crises como para a prevenção das mesmas, são anti-CGRP”, prosseguiu. 

O que pode atenuar os efeitos de uma enxaqueca?  

As pessoas que sofrem com enxaquecas “devem evitar os fatores desencadeantes”. Isto é, se determinada pessoa já sabe que o vinho branco vai, eventualmente, provocar uma crise, deve evitar tomar essa bebida. 

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A seguir, “é importante ter uma vida regular, com o sono regular e com hábitos de marcha todos os dias, ou ginástica. Não ter uma vida muito sedentária”. 

A neurologista refere que o exercício físico ajuda a libertar serotonina e a melhorar o humor. “Nas pessoas com depressão também há mais probabilidades de ter uma enxaqueca. Portanto, quanto melhor estivermos em termos de humor, menos crises teremos”, afirma.

Noutros casos, é preciso recorrer à medicação que ajuda “nas crises” e a “atenuar” os efeitos da enxaqueca. 

Para as pessoas que costumam ter mais do que quatro crises por mês e quando as enxaquecas são muito incapacitantes, “faz-se medicação diária, que é uma medicação preventiva”.

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Este artigo foi desenvolvido no âmbito do European Media and Information Fund, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e do European University Institute.

The sole responsibility for any content supported by the European Media and Information Fund lies with the author(s) and it may not necessarily reflect the positions of the EMIF and the Fund Partners, the Calouste Gulbenkian Foundation and the European University Institute.

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Categorias:

Neurologia

Etiquetas:

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24 Nov 2023 - 09:11

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